As duas faces da transição demográfica

Carmignac’s Note

Publicado
20 março 2024
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4 minutos de leitura

A demografia é um tema importante para a gestão das carteiras. Por um lado, o envelhecimento da população, que cria oportunidades em muito setores de atividade, causa sobretudo a nível macroeconómico receios de pressões deflacionistas «à japonesa» para todas as nações em envelhecimento. Por outro lado, o crescimento da população mundial conduz alguns a defenderem o decréscimo económico para combater o esgotamento dos recursos naturais.

O envelhecimento e os nascimentos são duas tendências paradoxais que originam, simultaneamente, estratégias opostas: compensar o envelhecimento e, ao mesmo tempo, travar o crescimento que facilitaria o seu financiamento. A contradição poderá ser resolvida através da promoção do trabalho, da produtividade e da revisão da projeção oficial da ONU, segundo a qual a população mundial só atingirá o seu pico por volta de 2085, após adicionar 2,3 mil milhões de bocas a alimentar às 8,1 mil milhões atuais.

As consequências do envelhecimento só se tornam potencialmente negativas para o crescimento económico quando a população ativa, entre 15-65 anos, diminui. A população ativa mundial começou a contrair em 2015, numa percentagem inferior a 0,1% por ano, atingindo 65% da população total. O segmento com menos de 15 anos está a diminuir a uma taxa ligeiramente inferior a 0,2% por ano, situando-se em 25% da população, enquanto a coorte com mais de 65 anos está a aumentar proporcionalmente, atingindo quase 10% atualmente1. No Japão, apenas 58,5% da população está em idade ativa, menos 10% do que em 1990, e os que têm mais de 65 anos representam 30% da população2.

O caso do Japão, um país avançado no processo de envelhecimento, suscita frequentemente o receio de um inverno deflacionista severo para todo o mundo e, em particular, para as economias mais maduras. Todavia, é necessário ter em conta vários fatores para relativizar este risco e os seus efeitos no crescimento. Em primeiro lugar, o Japão não compensou a fragilidade da sua demografia com a imigração.

Em segundo lugar, no plano económico, teve de conter a maior bolha imobiliária da história. Por último, as autoridades implementaram uma política económica que reforçou as pressões deflacionistas e o endividamento, e congelou o mercado de trabalho e, nomeadamente, os salários. Os países em envelhecimento podem aproveitar as lições japonesas para limitar os efeitos do seu próprio inverno demográfico. O do Japão resultou num crescimento económico per capita de 0,89% desde 1990, em comparação com 1,47% nos Estados Unidos e 1,03% em França. Nada mal para um inverno demográfico agravado por três fatores recessivos fortes.

Além das soluções decorrentes da imigração por motivos de trabalho, sendo cada vez mais claro que as populações de acolhimento exigem agora um maior controlo dos fluxos, existem soluções para atenuar o efeito do envelhecimento. O aumento da taxa de participação, incentivando mais mulheres a trabalhar, o prolongamento do período de atividade ou o aumento do número de horas de trabalho (difícil de impor atualmente no mundo desenvolvido, considerando as suas aspirações sociológicas) são as principais soluções. A melhoria da produtividade continua a ser uma solução essencial, obtida através do aumento do investimento, da formação e da inovação. A este respeito, é muito provável que a vaga da inteligência artificial constitua um fator importante para a adaptação estrutural à diminuição da população ativa, já que o seu potencial de ganhos de produtividade a longo prazo – e, por conseguinte, da sua capacidade de substituir a mão-de-obra em falta – parece elevado. Nesta perspetiva macroeconómica, o entusiasmo pela inteligência artificial (IA) é perfeitamente justificado.

As previsões independentes indicam um pico populacional por volta de 2045, atingindo um máximo de cerca de 9 mil milhões de habitantes e diminuindo para cerca de 7,5 mil milhões em 2100

A projeção da ONU é de um pico da população mundial de cerca de 10,4 mil milhões de habitantes em 2085, em comparação com os atuais 8,1 mil milhões. No entanto, as previsões independentes3 indicam um pico em 2045, culminando em 9 mil milhões de habitantes e diminuindo para 7,5 mil milhões em 2100. As previsões da ONU baseiam-se exclusivamente na extrapolação de dados estritamente demográficos, ao passo que as modelizações mais conservadoras simulam as relações entre as trajetórias de desenvolvimento socioeconómico e os limites do planeta. O recente declínio da população chinesa, muito superior às projeções recentes, reforça a credibilidade de um pico iminente. Se estas previsões mais «dinâmicas» continuarem a ser confirmadas pelos factos, a tentação do decréscimo provocado pelo receio de um planeta sobrepovoado poderá diminuir. Esta inversão permitiria um crescimento mais seguro e uma produtividade mais vigorosa graças a uma consideração mais realista dos constrangimentos do planeta associados à transição energética.

O trabalho e o progresso técnico gerarão crescimento e produtividade que, aliados a um uso mais pragmático dos recursos naturais, possibilitado pela iminência do despovoamento, ajudarão a economia a enfrentar os efeitos do envelhecimento. A robotização, na qual o Japão se tornou campeão por necessidade, a inteligência artificial, que chega no momento certo, e as investigações que evoluem noutros domínios importantes (nanotecnologias) testemunham a capacidade intacta de resposta da humanidade aos desafios lançados pela natureza e pela sua poderosa ciclicidade. A temática da inovação, liderada pela IA, bem como as situações demográficas muito diferenciadas em função da fase de desenvolvimento económico, criam múltiplas oportunidades de investimento e de diversificação geográfica, das quais uma abordagem ativa e global poderá tirar partido.

1Todos os dados demográficos anteriores provêm do relatório World Population Prospects das Nações Unidas, disponibilizado pela Our World in Data (dezembro de 2021).
2Estes valores são de 37% e 33% na França; 44% e 24% nos Estados Unidos; 55% e 19% na China; e 52% e 10% na Índia.
3Earth4all para o Clube de Roma, março de 2023.

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